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quinta-feira, 4 de abril de 2013

Lendas dos Orixás: Erinlé, Logun-Edé, Otim, Ossaim

ERINLÉ TEM A LÍNGUA CORTADA POR IEMANJÁ
Inlè-Ibualama ou Erinlè - escultura de Carybé
Erinlé era o mais belo dos caçadores.
Diziam que era andrógino,mas disso não se tem certeza.
O que se sabe é que Inlé era dono de uma beleza diferente e irresistível.
Tão belo que Iemanjá o amou assim que o viu.
Apaixonada, o raptou e o levou para o fundo do mar.
Satisfeitos os seus desejos, Iemanjá se cansou de Erinlé.
Então Iemanjá o devolveu ao mundo.
Mas Erinlé tinha vistos os mistérios do mar e passara a conhecer os seus enigmas.
Para que Erinlé não contasse os seus segredos, Iemanjá cortou sua língua.
A partir de então é Iemanjá que responde por Erinlé.
Erinlé fala por intermédio de Iemanjá.
Erinlé é o mais belo dos caçadores.



LOGUM EDÉ NASCE DE OXUM E ERINLÉ
Logunedé - escultura de Carybé

Um dia Oxum Ipondá conheceu o caçador Erinlé e por ele se apaixonou perdidamente.
Mas Erinlé não quis saber de Oxum.
Oxum não desistiu e procurou um babalaô.
Ele disse que Erinlé só se sentia atraído pelas mulheres da floresta, nunca pelas do rio.
Oxum pagou ao babalaô e arquitetou um plano: embebeu seu corpo em mel e rolou pelo chão da mata.
Agora sim, disfarçada de mulher da mata, procurou de novo o seu amor.
Erinlé se apaixonou por ela no momento em que a viu.
Um dia, esquecendo-se das palavras do adivinho, Ipondá convidou Erinlé para um banho no rio.
Mas as águas lavaram o mel de seu corpo e as folhas do disfarce se desprenderam.
Erinlé percebeu imediatamente como tinha sido enganado e abandonou Oxum para sempre.
Foi-se embora sem olhar para trás.
Oxum estava grávida; deu à luz Logum Edé.
Logum Edé é a metade Oxum, a metade do rio, e é metade Erinlé, a metade mato.
Suas metades nunca podem se encontrar e ele habita num tempo o rio e no outro tempo habita o mato.
Com o ofá, arco e flecha que herdou do pai, ele caça.
No abebé, espelho que recebeu da mãe, ele se mira

OTIM ESCONDE QUE NASCEU COM QUATRO SEIOS
Otin - escultura de Carybé
Oquê, rei da cidade de Otã, tinha uma filha. Ela nascera com quatro seios e era chamada de Otim.
O rei Oquê adorava sua filha e não permitia que ninguém soubesse de sua deformação.
Este era o segredo de Oquê.
Este era o segredo de Otim.
Quando Otim cresceu, o rei aconselho-a a nunca se casar.
Pois um marido, por mais que a amasse, um dia se aborreceria com ela e revelaria ao mundo seu vergonhoso segredo.
Otim ficou muito triste, mas acatou o conselho do pai.
Por muitos anos, Otim viveu em Igbajô, uma cidade vizinha, onde trabalhava no mercado.
Um dia, um caçador chegou ao mercado, e ficou tão impressionado com a beleza de Otim, que insistiu em casar-se com ela.
Otim recusou seu pedido por diversas vezes, mas, diante da insistência do caçador, concordou, impondo uma condição: o caçador nunca deveria mencionar seus quatro seios a ninguém.
O caçador concordou, e impôs também sua condição: Otim jamais deveria por mel de abelhas na comida dele, porque isso era seu tabu, seu euó.(*)

Por muitos anos, Otim viveu feliz com o marido.
Mas como era a esposa favorita, as outras esposas sentiram-se muito enciumadas.
Um dia, reuniram-se e tramaram contra Otim.
Era o dia de Otim cozinhar para o marido; ela preparava um prato de milho amarelo cozido, enfeitado com fatias de coco, o predileto do caçador.
Quando Otim deixou a cozinha por alguns instantes, as outras sorrateiramente puseram mel na comida.

Quando o caçador chegou em casa e sentou-se para comer, percebeu imediatamente o sabor do ingrediente proibido.
Furioso, bateu em Otim e lhe disse as coisas mais cruéis, revelando seu segredo: "Tu, com teus quatro seios, sua filha de uma vaca!, como ousaste a quebrar meu tabu?"
A novidade espalhou-se pela cidade como fogo. Otim, a mulher de quatro seios, era ridicularizada por todos.Otim, fugiu de casa e deixou a cidade do marido
Voltou para sua cidade, Otã, e refugiou-se no palácio do pai.
O velho rei a confortou, mas ele sabia que a noticia chegaria também a sua cidade.Em desespero, Otim fugiu para a floresta.
Ao correr, tropeçou e caiu. Nesse momento, Otim transformou-se num rio, e o rio correu para o mar.
Seu pai, que a seguia, viu que havia perdido a filha.
Lá ia o rio fugindo para o mar.
Querendo impedir o Rio de continuar sua fuga, desesperado, atirou-se ao chão, e, ali onde caiu, transformou-se em uma montanha, impedindo o caminho do rio Otim para o mar.
Mas Otim contornou a montanha e seguiu seu curso.
Oquê, a montanha, e Otim, o rio, são cultuados até hoje em Otã.
Odé, o caçador, nunca se esqueceu de sua mulher.

(*)euó = interdição religiosa, tabu, quizila

OSSAIM DÁ UMA FOLHA PARA CADA ORIXÁ
Osanyin - escultura de Carybé
Ossaim, filho de Nanã e irmão de Oxumaré, Eua e Obaluaê, era o senhor das folhas, da ciência e das ervas, o orixá que conhece o segredo da cura e o mistério da vida.
Todos os orixás recorriam a Ossaim para curar qualquer moléstia, qualquer mal do corpo.
Todos dependiam de Ossaim na luta contra a doença.
Todos iam à casa de Ossaim oferecer seus sacrifícios.
Em troca Ossaim lhes dava preparados mágicos: banhos, chás, infusões, pomadas, abô(*), beberagens.
Curava as dores, as feridas, os sangramentos; as disenterias, os inchaços e fraturas; curava as pestes, febres, órgãos corrompidos; limpava a pele purulenta e o sangue pisado; livrava o corpo de todos os males.
Um dia Xangô, que era o deus da justiça, julgou que todos os orixás deveriam compartilhar o poder de Ossaim, conhecendo o segredo das ervas e o dom da cura.
Xangô sentenciou que Ossaim dividisse suas folhas com os outros orixás.
Mas Ossaim negou-se a dividir suas folhas com os outros orixás.
Xangô então ordenou que Iansã soltasse o vento e trouxesse ao seu palácio todas as folhas das matas de Ossaim para que fossem distribuídas aos orixás.
Iansã fez o que Xangô determinara.
Gerou um furacão que derrubou as folhas das plantas e as arrastou pelo ar em direção ao palácio de Xangô.
Ossaim percebeu o que estava acontecendo e gritou:

“Euê uassá!” 
"As folhas funcionam!”

Ossaim ordenou às folhas que voltassem às suas matas e as folhas obedeceram às ordens de Ossaim.
Quase todas as folhas retornaram para Ossaim.
As que já estavam em poder de Xangô perderam o axé, perderam o poder de cura.

O orixá-rei. Que era um orixá justo, admitiu a vitória de Ossaim.
Entendeu que o poder das folhas deveria ser exclusivo de Ossaim e que assim devia permanecer através dos séculos.
Ossaim, contudo, deu uma folha para cada orixá, deu uma euê(**) para cada um deles.
Cada folha com seus axés(***) e seus ofós(****), que são cantigas de encantamento, sem as quais as folhas não funcionam.
Ossaim distribuiu as folhas aos orixás para que eles não mais o invejassem.
Eles também podiam realizar proezas com as ervas, mas os segredos mais profundos ele guardou para si.
Ossaim não conta seus segredos par ninguém, Ossaim nem mesmo fala.
Fala por ele seu criado Aroni.
Os orixás ficaram gratos a Ossaim e sempre o reverenciam quando usam as folhas.

(*) abô= infusão de água com folhas maceradas e outras substâncias.
(**)euê = folha.
(***) axés =  força mistica dos orixás, força vital que transforma o mundo.
(****) ofós = cantigas de encantamentos.


Fonte: Mitologia dos Orixás - Reginaldo Prandi - Companhia das Letras

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